quarta-feira, 3 de setembro de 2008

NOSFERATU: SINFONIAS PARA UM DISCURSO SOBRE O SUJEITO

Nosferatu é um filme mudo, alemão, de F. W. Murnau, produzido em 1922. Curiosidades a parte, quero me ater brevemente a três elementos que produzem efeitos de sentidos que não podem escapar ao espectador: um tipo de estória de amor, a monstruosidade do corpo e a virtualidade corpórea do homem contemporâneo.
Apresentando a estrutura clássica de um filme de vampiro como todos aqueles que se basearam em Drácula, de Bram Stoker, temos uma trágica trilogia amorosa entre o vampiro, Nosferatu, a bela moça, Nina, e o mocinho da estória, Jonathan Haker. Esse amor compartilhado pelos/e entre os três personagens não é explícito nesse filme, mas pode ser compreendido e verificado em versões posteriores como Drácula e Entrevista com vampiro. Certamente, não considero Nosferatu um filme isolado, mas povoado a sua margem por outros enunciados, que o desloca para outros espaços, produzindo efeitos que fazem parte de mosaicos cinematográficos alhures.
O corpo de Noferatu fora dos padrões normais da época na qual encontra ressonância, aponta para uma sociedade da normalização dos corpos, mostrando lugares considerados normais e outros anormais, dicotomizando, assim, comportamentos, sentimentos, anomalias e amores. A presença de um corpo próximo à bestialização, com unhas longas como de animais, olhos esbugalhados como o do louco sempre em espanto constroem os contornos de um corpo segregado, cuja figura meio animal/meio homem desautoriza o sujeito socialmente e o exclui das regras e normas das práticas da vida. Assim, o filme nos dá a ver o elemento de distúrbio da ordem, de desestabilização do poder, de desestruturação do amor nas linhas familiares do papai e mamãe.
Nosferatu se apresentará também sob suas sombras refletidas nas paredes, nos muros, nos olhos do próprio espectador. Essas inquietantes sombras de uma simples e natural imagem do corpo de Nosferatu nos lançam a nossa própria arqueologia e governo da produção humana de imagens: de um lado, é prova da negação do corpo dissolvido em seus contornos, mas de outro, é a marca indubitável do paradoxo da própria ausência daquele corpo. Ora, estamos diante da virtualidade dos corpos, objeto de discussão no século XXI, mas já caracterizado nos inícios do século XX.
Enfim, esses poucos elementos começam a delinear a história de um sujeito do desejo, que nos move, nos faz olhar a nós próprios, olhar também do qual fugimos, mas um olhar inquiridor, vindo de uma suposta janela da frente... O que, então, olha Nosferatu, preso às vidraças de sua janela? Para quem olha? Por que olha? Mais do que querer espelhar algo, ao meu ver, o filme Nosferatu produz imagens de nossos anseios e desejos, tecendo linhas que constituem a arqueologia dos saberes do homem de hoje.

Nilton Milanez


5 comentários:

DE QUÊ SE OCUPA O GEPAD? disse...

Parabenizo ao Prof. Nilton e ao grupo pela iniciativa e pela realização do primeiro encontro. Que os próximos sejam tão bons quanto!!!
Profa. Luci Mara - DFCH

Nilton Milanez disse...

Gostaria de deixar registrado um dos comentários do público: o fato de Ellen andar sobre a ponta dos pés. Achei muito legal a resposta de Luara, que disse que se o filme tivesse sido feito hoje, ela flutuaria. É exatamente essa imagem que provoca o fato dela andar na ponta dos pés, com os braços levantados, realização do devaneio, do sonho, do alhures.

James Freire disse...

A expressividade corporal é a nota tônica neste filme. Expressividade que faz da atuação das personagens algo quase que tangível.

James Freire

Rafael Carvalho disse...

Há tempos que tinha esse filme aqui em casa, mas nunca tinha visto. Com esse curso do grupo de pesquisa, aproveitei pra ver e ainda ganhei de presente uma aula sobre o discurso e uma reflexão sobre o corpo bastante interessante. Parabéns a todos!

Aproveito e deixo aqui o indereço do meu blog em que faço comentários sobre filmes. Moviola Digital (http://movioladigital.blogspot.com/). Abraços e que venha Freaks amanhã!

Celso Rios disse...

O filme passa uma concepção muito interessante entre o belo represetado por Ellen e o feio por Nosferatu e a música de fundo da um ar de suspense e surpresa ao filme.